Resumo da palestra
A Inquisição foi uma das maiores agressões já sofridas pelos judeus, além do Holocausto e das Cruzadas. Para salvar a vida, muitos judeus foram obrigados a se converter ao cristianismo, tornando-se “cristãos novos”, mas mesmo esta situação não os protegia completamente, pois eram suspeitos de, no íntimo ou na vida privada, manter a fé e algumas práticas judaicas, o que podia levá-los à prisão, a torturas e à morte pelo fogo, pelo garrote ou pelos maus tratos.
Sabemos sobre nossa história durante os tempos bíblicos, e sobre os últimos 3 séculos, mas relativamente pouco sobre a história dos judeus no intervalo entre ambos.
A pesquisa histórica a respeito da época da Inquisição e dos cristãos novos, que iniciou no século XIII e se estendeu por mais de quinhentos anos, é relativamente recente.
Esta história teve reflexos não apenas em Portugal e Espanha, onde se originou, mas também em suas colônias no Novo Continente, especialmente no Brasil, através das navegações e da colonização portuguesa.
Teve consequências também na França, Países Baixos e no norte da Alemanha, para onde se deslocaram muitos judeus e cristãos novos.
Ou seja, muitos judeus de origem alemã, ou askenazi em geral, tem também antepassados sefardi. Além disso, devido à assimilação da maioria dos cristãos-novos, há uma significativa componente étnica judaica na população em geral, principalmente em Portugal e no Brasil, e de forma ainda mais pronunciada no nosso Nordeste.
A Inquisição operava através de uma aliança entre a Igreja Católica e os governos civis. Seu objeƟvo declarado era a salvação das almas dos cristãos (novos e velhos) através da “verdadeira” fé, mas a isso se misturavam interesses econômicos, tais como o confisco dos bens dos cristãos novos, e a concorrência no trabalho, nas finanças e nas profissões, e também conflitos entre países, principalmente pelo domínio dos mercados mundiais e das terras da América do Sul.
Ou seja, formalmente a Inquisição visava os cristãos, não os judeus.Inicialmente, os governos civis (não a Inquisição) ofereciam aos judeus duas opções: a conversão e a emigração.
No entanto, os convertidos, chamados “cristãos novos”, continuavam a manter hábitos de educação e trabalho, e alianças que preservavam certas vantagens econômicas, portanto continuavam a ser uma ameaça, uma concorrência.
Mas, como agora eram cristãos, ficavam sob o foco da Inquisição, com riscos de prisão, tortura e morte. Em muitos casos, havia novamente a opção da emigração para lugares menos hostis.
Isto aconteceu, por exemplo, com a família do filósofo Baruch Spinoza, cuja família, de cristãos novos, emigrou de Portugal para Amsterdam, onde o ambiente relativamente tolerante lhes permitiu o retorno à prática do judaísmo.
A família Spinoza falava português e vivia do comércio de madeira e outros produtos que importavam do Brasil.
A família de Spinoza, antes de se tornar cristã-nova, já havia se convertido ao cristianismo por pressão do domínio cristão pré- mouros (muçulmanos), retornado ao judaísmo por causa da tolerância do domínio mouro, e novamente ao cristianismo após a expulsão dos mouros da Península Ibérica pelos reis católicos.
Curiosamente, por causa de suas ideias, Spinoza acabou sendo também expulso da comunidade judaica. As navegações (Vasco da Gama, Cristóvão Colombo, Pedro Álvares Cabral, e outros) ocorreram ao mesmo tempo que a Inquisição, mas não foi apenas coincidência.
Os judeus e cristãos novos:
Tinham experiência e conhecimentos de navegação por instrumentos, cartografia e astronomia, e ajudaram D Henrique, o Navegador, filho do rei D Manuel I, a montar a Escola de Sagres
ajudaram a financiar as navegações
interesse econômico na exploração das novas terras (madeira, ouro, açúcar)
interesse em se afastar das sedes da Inquisição, Espanha e Portugal
No Brasil, não foram constituídos tribunais da Inquisição.
Os acusados eram levados para o Tribunal de Lisboa, onde eram julgados, com a ajuda de torturas visando obter confissões e novas acusações, e cumpriam a pena, muitas vezes de morte pelo fogo, forca ou garrote.
No Brasil, os cristãos-novos se concentraram inicialmente no Nordeste, principalmente na Bahia e em Pernambuco, onde se dedicaram à agricultura do açúcar, e aos engenhos que faziam o processamento da cana, para chegar ao açúcar como o conhecemos.
Alguns já tinham experiência das ilhas portuguesas do Atlântico. Mais tarde, quando os holandeses ocuparam o Nordeste, vários judeus e cristãos-novos fizeram plantações e engenhos nas redondezas do Rio de Janeiro.
Uma das famílias mais conhecidas de cristãos novos na agricultura do açúcar foi a de Diogo Fernandes e Branca Dias. Branca mantinha secretamente o judaísmo, praticando-o em casa.
Foi denunciada, aprisionada, levada para Lisboa, julgada e condenada a alguns anos de prisão, após os quais voltou ao Brasil.