Autor: Sergio Daniel Lerrer

Apesar de não aparecerem de forma visível e organizada nos livros oficiais da História no Brasil, os judeus estão no Brasil desde o seu descobrimento, ou talvez, ainda antes.  Provavelmente após os indígenas, são a comunidade de linha imigratória contínua para nosso país ao longo dos séculos.

Por motivos variados, em boa parte pela necessária invisibilidade étnica para poderem sobreviver e ter uma geografia para suas famílias, não constam na sua identidade judaica em relatos importantes, como a vinda expressiva de não convertidos e convertidos a cristãos novos ao país, na participação nos grupos de planejamento e idealização dos períodos das navegações e descobertas, e em várias ocupações do país pelos séculos.

Mesmo após esse período histórico da formação brasileira, os judeus prosseguiram na busca de terras com liberdade para formarem suas comunidades longe de uma Europa e Ásia em convulsão religiosa, social e política oscilante entre regimes de intolerância e dominância. E assim, em imigrações avulsas, comunitárias e familiares, foram buscando regionalidades conforme a conveniência, momento do Império e da República no Brasil, e chegando ao país.

As imigrações informais, e clandestinas, como boa parte daqueles que chegaram ao país sem ser pelas rotas portuguesas, foram se acomodando em locais em que buscaram a melhor sobrevivência, podendo misturar-se sem ser evidenciada em demasia a origem judaica, e aceitando a tolerância possível. Dessa forma, no aspecto governamental, e institucional e político, em função dessa pulverização e capilarização, a questão judaica nunca foi uma questão.

Diferentemente ocorreu no final do século XIX quando ocorreram os primeiros contatos entre a ICA – Jewish Colonization Association e o Governo brasileiro, especialmente através do Governo do Rio Grande do Sul.

Foi oportunidade histórica na qual as Américas em geral buscavam ocupação de seu território, fazendo chamamento para imigrações, visando força de trabalho, desenvolvimento geográfico, melhor exploração da matéria prima local.

No Rio Grande do Sul especificamente, acompanhando o movimento da Argentina, o chamamento era mais focado em imigrantes europeus acostumados com a terra, preferencialmente brancos, em busca de prosperidade, oportunidades, terra e menos tensão social.

Nesta janela que a ICA, organização filantrópica do Barão e Baronesa Hirsch, negociou aquisição de terras nas Américas para as colônias imigratórias para judeus do Leste Europeu, especialmente procedentes da região pobre e repleta de perseguições da Bessarábia.

Ao invés de algumas imigrações misturadas com as alemãs puras, nas quais judeus se camuflavam e chegavam como católicos, em municípios como Dois Irmãos / RS e Nova Petrópolis, pela primeira vez judeus chegariam como judeus de fato, pela porta da frente, em acordos à luz do dia, com conhecimento de Governos e da sociedade.

E assim começou o único programa imigratória baseado em colonização que trouxe judeus para o Brasil, criando as colônias de Philippson na então Santa Maria, e Quatro Irmãos, no alto Uruguai gaúcho.

Foi a única imigração judaica de fato oficial na História do Brasil, reconhecendo seu caráter judaico, mesmo em relação aos casos de passaportes disfarçadamente fornecidos a judeus durante o Holocausto, por agentes diplomáticos brasileiros pró Aliados como Araci Guimarães e Souza Dantas.

Por isso seu significado, enquanto imigração de caráter judaico, de volume, envolvendo aquisição de terras, ocupação comunitária e acordos governamentais.

As colônias judaicas do sul, especialmente de Quatro Irmãos, maior em extensão, volume e diversidade, foram campo de germinação de ideias e empreendedorismo, na saúde, na inovação, na logística e desenvolvimento.